Li o livro da Calila em duas partes e em momentos bem diferente. A primeira metade foi na praia, num calorão danado batendo no corpo deitado na areia do Rio de Janeiro. Um tanto de conversa ao redor, barulho de mar e pausas para a água de coco ou o picolé. E Planta Oração acabou virando um daqueles livros de praia, que carrega um pouco de areia e maresia na capa.⠀ ⠀A segunda metade, felizmente, li depois de conhecer Calila na FLIP. E depois de ouvir a voz cantada de Calila nas ruas de Paraty. E ouvir a voz da Calila, calma, serena, mudou completamente a minha experiência de leitura.⠀ ⠀Antes eu tentava ler os contos de Planta Oração com o ritmo frenético e em parafuso que minha cabeça entrou nesse ano. Depois, com a voz da autora ressoando na cabeça, todo o ordenamento de palavras começou a fazer muito mais sentido e entendi que os contos de Calila são feitos para ler devagar, pra fazer a gente recordar de algum pé de manga no quintal, um pé de goiaba em que subia pra esconder do povo, um pé de amora que sujava a mão. Os contos de Calila são desses de despertar um tanto de lembrança e memória inventada. Cheiro de infância passando devagarzinho, o pé passeando suave ou áspero num tronco, o corpo pegando sombra no tempo do dia passar.⠀ ⠀Daí sim entendi o chamado.⠀ ⠀Literatura pra mim sempre foi um tanto de ritmo e experimento. E eu adorei saber que inventei de levar pra praia logo o livro da Calila, que é nascida no litoral e vive hoje lá no cerrado tão distante do mar de onde vim, que deixa a gente sempre um pouco na saudade inventada do corpo que nunca viveu realmente na maresia.⠀ ⠀Foi uma das últimas escritoras brasileiras e contemporâneas que li nesse ano. Pra me lembrar que a vida vai se fazendo assim, sem atropelo, no avesso da pressa.⠀
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