Devorei
Comi um poema. Devorei de uma vez só, tal qual o doce favorito. Taquei-lhe um pouco de sal na medida certa. Pimenta não, pois é certo que não gosto do ardor na boca, quanto mais na palavra. A palavra forte, quando dita, já arde por si só. Experimenta dizer algo de fim quando sente amor, vai lhe cortar todas as papilas. Experimenta ainda dizer algo de saudade quando essa lhe é certa, vai queimar o céu da boca e lhe descer uma saliva quente até o estômago. A palavra que decide tem gosto marcante, sinto cada uma, de todo instante, se misturar ferozmente aos quatro cantos da língua. Mas o poema que comi agora, calada, de olhos fechados, tinha gosto suave, desceu escorregando devagarzinho. Não era decisivo a ninguém, era um verso solto no tempo. Vai ver que era palavra de transição, experimentar-se é o que nos resta.
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